A água lembra algo?
Fernanda Rocha
Fernanda Rocha
| 05-12-2025
Equipe de Ciências · Equipe de Ciências
A água lembra algo?
Você já ouviu alguém dizer que “a água tem memória”? A princípio, isso pode soar como algo de um filme de ficção científica — como um líquido poderia se lembrar de algo?
Mas a ideia existe há décadas e ainda é explorada e debatida hoje. Vamos mergulhar na ciência, nos mitos e nos mistérios em torno do conceito de memória da água.

De onde veio a ideia?

A ideia de que a água teria memória se tornou conhecida em 1988, quando o imunologista francês Dr. Jacques Benveniste publicou um estudo polêmico na revista Nature.
Sua pesquisa sugeria que a água poderia “lembrar” substâncias que uma vez foram dissolvidas nela, mesmo depois de essas substâncias serem diluídas a ponto de não restar nenhuma molécula do original. Essa afirmação surpreendeu muita gente — e, para muitos cientistas, era difícil de acreditar.
Críticos argumentaram que ia contra princípios básicos da química. Ainda assim, a ideia chamou atenção, especialmente em áreas como a medicina alternativa, onde algumas pessoas esperavam que isso explicasse como remédios altamente diluídos poderiam funcionar.

O que é memória da água?

Memória da água é a ideia de que as moléculas de água podem, de alguma forma, “lembrar” ou manter propriedades de substâncias com as quais entraram em contato, mesmo quando essas substâncias não estão mais presentes fisicamente.
A teoria sugere que a estrutura da água muda de maneira significativa — quase como uma impressão digital — e que essa estrutura poderia influenciar o comportamento da água posteriormente. É importante ressaltar que a ciência mainstream não aceita a memória da água como um fato comprovado.
A maioria dos especialistas acredita que, se uma molécula não está mais presente em uma solução, ela não deveria ter efeito algum. No entanto, pequenos grupos de pesquisadores ainda exploram a possibilidade de que a água tenha propriedades incomuns que ainda não compreendemos totalmente.

Como a água se comporta em nível molecular?

Para entender melhor, precisamos observar como as moléculas de água interagem. Uma molécula de água é formada por dois átomos de hidrogênio e um de oxigênio (H₂O). Essas moléculas formam ligações de hidrogênio, que se quebram e se reformam constantemente, conferindo à água seu comportamento fluido único.
Alguns pesquisadores defendem que essas ligações permitem que a água forme estruturas ou aglomerados de curto prazo que poderiam, teoricamente, “armazenar” informações — pelo menos por um período muito breve.
Mas a maioria dessas estruturas desaparece em picosegundos (trilionésimos de segundo), o que torna a ideia de memória de longo prazo altamente improvável.

Existe algum suporte científico?

Alguns estudos recentes usaram técnicas avançadas, como espectroscopia e nanotecnologia, para analisar o comportamento da água mais detalhadamente. Alguns desses experimentos observaram mudanças na estrutura da água após exposição a certas condições, como campos eletromagnéticos ou materiais específicos.
No entanto, essas descobertas ainda não são suficientes para provar que a água pode armazenar informações ao longo do tempo.
Na verdade, a maioria dos estudos revisados por pares não conseguiu reproduzir os resultados alegados por Dr. Benveniste ou outros que apoiam a teoria da memória. Por isso, a memória da água continua sendo um tema altamente controverso na ciência.

Por que algumas pessoas ainda acreditam nisso?

Mesmo sem confirmação científica, a ideia permanece popular em algumas práticas de medicina alternativa — especialmente na homeopatia. Remédios homeopáticos frequentemente envolvem diluições extremas, onde quase nenhuma molécula do original permanece.
Os defensores acreditam que a memória da água poderia explicar como esses tratamentos funcionam. No entanto, grandes organizações de saúde, como a Organização Mundial da Saúde (OMS) e a Administração de Alimentos e Medicamentos (FDA) dos EUA, não reconhecem a memória da água como conceito cientificamente válido para tratamentos médicos.
A maioria dos médicos e pesquisadores concorda que mais evidências sólidas são necessárias antes de considerar a teoria confiável.

Água e emoções: outro ponto de vista

Você talvez já tenha ouvido falar do Dr. Masaru Emoto, pesquisador japonês que afirmava que a água reage a emoções e intenções humanas. Ele fotografava cristais de água congelada e afirmava que palavras ou músicas positivas formavam padrões bonitos e simétricos, enquanto palavras negativas geravam formas distorcidas.
Seu trabalho se tornou famoso através de livros e documentários, mas foi amplamente criticado por falta de controle científico e dados revisados por pares. Ainda assim, suas ideias continuam inspirando pessoas a refletirem sobre nossa conexão com a água.

O que a ciência mainstream diz?

A maioria dos cientistas concorda que a água é uma substância incrível e única — mas não há evidências confirmadas de que ela tenha memória. Suas propriedades, como alta tensão superficial, capacidade de dissolver muitas substâncias e papel nos processos da vida, são bem compreendidas.
Mas quando se trata de memória, a física e a química atuais não apoiam a ideia. Isso não significa que o assunto esteja totalmente fechado. A ciência está sempre evoluindo, e pesquisadores continuam explorando novas ideias. Mas, por enquanto, a maior parte dos especialistas permanece cética.
A água lembra algo?

O que podemos aprender com isso?

Independentemente de a água ter memória ou não, a curiosidade e o debate contínuos nos lembram de algo importante: a natureza ainda está cheia de mistérios. Até algo tão familiar quanto a água pode nos surpreender, e a ciência precisa permanecer aberta, mas rigorosa.
Essas discussões também mostram o valor do pensamento crítico. É saudável ser curioso e explorar ideias estranhas — mas também precisamos questionar, buscar evidências e aceitar quando algo não foi comprovado.

Então… a água lembra?

A resposta curta? Provavelmente não — pelo menos não de uma forma que a ciência atual consiga confirmar. Ainda assim, o tema continua despertando interesse e inspirando novos estudos, incentivando as pessoas a observarem mais de perto as coisas do cotidiano e a fazer perguntas mais profundas.